Licenças: liberdade para quem?

Vamos discutir mais sobre as licenças (GPL, BSD, CC), seus objetivos, decisões envolvidas, casos comentados (declaração de Stallman, lucro com suporte, logomarca do Fedora, sabores dos Ubuntus) para chegarmos à questão: a liberdade é para quem?

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Por: celio ishikawa em 12/01/2010


Stallman disse que a liberdade não inclui liberdade para se acorrentar (GPL x BSD)



O famoso Richard Stallman deu entrevista ao LinuxMagazine de agosto de 2009 (o que pode ser conferido aqui ou no Br-linux.org, e ali ele diz: "Liberdade não é liberdade de escolha. Ter opção de se acorrentar reduz sua liberdade. É simples: engana-se quem identifica liberdade como liberdade de escolha, porque a liberdade de se permitir acorrentar não aumenta sua liberdade - provavelmente a diminui."

Algumas pessoas ao lerem essa declaração se lembraram da discussão entre as licenças BSD x GPL, pois a licença BSD permite que trabalhos derivados do software licenciado sob BSD se tornem proprietários, enquanto que o GPL diz que os trabalhos derivados têm de continuar a serem GPL, ou seja, softwares livres em oposição aos proprietários.

Dizem os defensores da licença BSD que essa licença, ao permitir fechar o software dá uma opção a mais de escolha ao programador que vai fazer obra derivada do software original: a opção de explorar comercialmente o novo software-produto da mesma forma como os desenvolvedores de softwares proprietários fazem.

Por outro lado, os defensores da licença GPL dizem que nada impede o software licenciado sob GPL de ser comercializado ao preço que convir. Um artigo da Free Software Foundation (FSF) diz que ao contrário do que muitos pensam, eles encorajam essa prática ("we encourage people who redistribute free software to charge as much as they wish or can") e que as pessoas podem cobrar desde nada a 1 bilhão ("You can charge nothing, a penny, a dollar, or a billion dollars") e recomendam o termo "distribuir software livre por uma taxa" ("distributing free software for a fee") ao invés de "vender" ("selling").

Mas é bom reparar que a FSF permite vender, mas não restringir o número de cópias, o que seria possível no software proprietário (não que todos os softwares proprietários restrinjam cópias, mas é prática comum). E outro aspecto é que softwares proprietários podem restringir o acesso ao código-fonte (embora haja os que apesar de proprietários são de código aberto.

Em termos de business: o software proprietário restringe que usuários comuns atuem (e talvez ganhem dinheiro) como copiadores ("piratas" que copiam) e também restringe que programadores atuem (e talvez ganhem dinheiro) como criadores de novos produtos derivados ("piratas" que modificam).

Estão certas as pessoas que observam uma contradição no discurso de defesa da liberdade do GPL: GPL garante liberdade menos a do software livre se comportar como software fechado. A meu ver não há problema nisso, até porque muitas leis, manifestos etc garantem plena liberdade para os indivíduos dentro do território X, menos a liberdade de irem para o território Y sem abrirem mão dos benefícios de estarem no território X. Ou então liberdade de comportamento para os membros X menos a liberdade para atuarem contra outros membros X.

O que nos interessa aqui é que os termos da GPL ao permitirem cópia e modificação acabam interferindo no modelo de negócios. Os adeptos da filosofia do software livre (incluindo os que defensores do BSD que pensam comunitariamente, ou seja, permitem uso proprietário mas não agem assim) dizem que no software pode-se ganhar dinheiro com suporte e não com a venda das cópias.

Por outro lado, a meu ver, a principal restrição que os programadores querem aproveitar da licença BSD é a restrição da liberdade dos usuários comuns (leigos) fazerem várias cópias dos programas. Assim, a licença BSD garante mais liberdade para a comunidade dos desenvolvedores, mas menos liberdade para a comunidade dos usuários. Claro que há muitos programas sob licença BSD que permite que usuários comuns copiem, o sistema FreeBSD é um exemplo. Mas essa liberdade não é garantida pela licença, e o MacOSX que usa pedaços do FreeBSD é um exemplo.

Mas afinal as licenças não são para a comunidade de desenvolvedores mesmo? Acho que no mundo atual, em que os softwares livres estão difundidos a resposta é sim e não. Sem dúvida, no início tanto o GPL quanto BSD foram pensadas para os programadores, mas a disseminação conseguiu fazer, por exemplo, com que as pessoas (da mídia em geral) repensasse sobre clausuras dos softwares proprietários tais como de restrição para países como Cuba ou Irã. Daí pergunto: a liberdade visava a liberdade para os programadores cubanos ou para o povo cubano? SE o software livre é citado em programas de inclusão digital é para incluir os programadores ou os leigos?

Para o empresariado (ou cooperativados, ou seja lá que outros modelos de empreendimento) vamos resumir da seguinte forma: Para o empresário-programador a licença BSD permite a exploração comercial no modelo proprietário, ou seja, com restrição de cópia e de criação de produtos derivados. O empresário-leigo (que não entende de programação) que esteja lidando com licença BSD pode ou não vender cópias, dependendo se ele está lidando com coisas como FreeBSD ou como MacOSX. No último caso, uma parte da venda tem de ser repassada à Apple. E no caso de licenças GPL, tanto o empresário programador quanto o leigo podem vender cópias, mas o empresário programador tem a vantagem de oferecer suporte. Contudo, o empresário-leigo pode vender uma versão modernizada (que tenha incluído suporte a alguma coisa, que talvez tenha pedido ao empresário programador como cliente) sem repassar uma parte para o programador.

Vejamos adiante mais casos interessantes.

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Páginas do artigo
   1. Stallman disse que a liberdade não inclui liberdade para se acorrentar (GPL x BSD)
   2. Quem tem direito de ganhar dinheiro? O leigo ou o programador? O manual faz parte do suporte?
   3. As 6 letras do Fedora. Arte x Software (e exercício: Creative Commons x GPL)
   4. Conclusão
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Comentários
[1] Comentário enviado por cruzeirense em 14/01/2010 - 12:24h

Prezado celio ishikawa

Muito bom seu artigo.
Eu pessoalmente acredito que as licenças deveriam favorecer mais (financeiramente) o desenvolvedor do software. O usuário final tem que pagar pelo bom software que usa. É como uma cadeia alimentar onde um depende do outro. Se o usuário parar de pagar, o programador para de desenvolver e o ciclo é quebrado.
Agora, uma questão que achei interessante, é a quem pagar. Quem merece o dinheiro pago pelo software? Softwares open source são desenvolvidos por n pessoas e não seria justo que apenas o último que compilou fique com todos os frutos do trabalho.

Parabéns pelo artigo

[2] Comentário enviado por celioishikawa em 15/01/2010 - 11:38h

Ola cruzeirense, agradecido.
Essa questão da viabilização financeira realmente é importante, e o próprio FSF colocou na lista de suas 10 maiores prioridades um sistema de troca de comunicação e recebimento de doações, ou seja, de alguma forma o dinheiro tem de entrar, seja pelas doações ou cobrando do usuário final, é algo que precisa ser aperfeiçoado mesmo.

Sobre a quem pagar, de fato veremos em breve como as pessoas reagirão ao Google ChromeOS: o Google colheu tanto elogios quanto críticas ao longo desses anos e veremos se as pessoas dirão se ela merece lucrar com Linux ou não.

Achei que poderia ter explicitado mais a ironia na página 3: a questão é que a licença BSD que dizem ser a mais permissiva pode-se mostrar menos permissiva que o CC caso a pessoa a quem passar adiante o código sob BSD restrinja as cópias. É o que falei da licença BSD deixar mais liberdade para os programadores, mas menos liberdade para os usuários finais.

Eu pessoalmente acho a licença BSD complicada, útil mais para projetos que estão em estado tão embrionário que o programador prefira deixar que as pessoas usem seja para qual propósito for (deixando para outroa decisão de deixar livre ou restringir). Caso a intenção seja deixar livre, pergunto se ao invés de BSD não seria melhor que o GPL. E caso o intenção seja restingir, pergunto se não é melhor combinar o GPL com alguns atributos restritivos do CC (como a não-derivação ou não-comercialização).

atualização 15/1/10: Stallman sobre a questão que se refere tanto à licença BSD quanto o licenciamento duplo (GPL e proprietário), ou seja, aqueles que permitem que surjam trabalhos derivados proprietários. Stallman acha que tudo bem o programador ser permissivo quanto essas coisas, mas ele acha antiético o programador do trabalho derivado optar pelo modelo proprietário.

"ele conclui que o programador de software livre que oferece seu software (livre) sob uma exceção que permitirá a um terceiro inclui-lo em um software proprietário não está praticando um ato anti-ético. Mas quem aceita a oferta deste programador está."
Confira em http://br-linux.org/2010/mysql-ensaio-de-richard-stallman-sobre-a-venda-de-excecoes-a-gpl/


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